Ser mãe invisível no exterior

Sou mãe de um bebê recém-nascido no exterior e algo curioso tem acontecido: fiquei invisível!

Eu e meu filho somos um pouco ruivos, já meu marido, que é nativo, tem os cabelos bem escuros.

Em todo encontro familiar escuto de seus parentes que a cor dos cabelos e tom da pele distintos ao do meu esposo devem ser herança de tias-avós, nunca vistas por ninguém vivo naquela roda!

Bastaria subir o olhar para a “peça” que segura o primogênito e seria notada nossa descarada semelhança.

A primeira vez que aconteceu achei graça.

Pensei que era um ato falho de um único membro da família. Mas, essa cena se repetiu e volta a se repetir toda vez que há uma reunião.

Parece impossível fazer a família do meu esposo notar que minha carga genética, minha família e minha história prévia à eles existe.

E essa invisibilidade não fica só por aí. Há várias outras situações que têm o mesmo pano de fundo, uma velada falta de importância daquilo que somos em outro lugar.

Sem que a gente perceba, morando no país do parceiro ou parceira somos engolidos por seu mundo.

As conversas são muito mais frequentes e profundas sobre os conflitos que estão acontecendo no círculo de convívio deles do que sobre o que ocorre na nossa vida.

Seremos nós os culpados por não insistir em materializar nosso mundo ou o outro, por oferecer talvez, ouvidos desinteressados?

ser mãe invisível no exterior

Não sei a resposta. Mas, assumo minha parte na responsabilidade dessa história mal contada!

É mal contada porque com o tempo enferrujamos a habilidade de envolver a outra pessoa no relato de um acontecimento que é só nosso.

Tão nosso que é só brasileiro e com isso traz gente, lugares e frases que esse outro, sendo estrangeiro, não conhece e para não nos metermos numa enredadeira de explicações vamos encurtando, encurtando, até que a história fica sem importância para ser contada.

Porém, é das milhares de coisas sem importância que a intimidade está feita.

Eu quero que meu filho habite minhas histórias e seus personagens.

Quero que ele consiga imaginar a dimensão dos meus acontecimentos quando eles surgirem, da mesma maneira que eu consigo quando meu companheiro me conta algum fato do seu dia.

Terei que arregaçar as mangas e perder essa espécie de preguiça, que muitas vezes nos impede de pintar o quadro tão complexo que é a nossa história mostrada em miúdos.

Talvez, essa seja uma possibilidade de sair da invisibilidade que sem querer adquirimos ao irmos viver fora.

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2 Responses

  1. Estou chorando!
    Não sei se foi o texto que descreve com detalhe a dor ou se sou eu que apenas estou com os sentimentos a flor da pele depois do parto.

    Bem, queria deixar aqui a minha gratidão por ter lido isso.
    Obrigada!

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